Um pouco de história
A primeira gestação exitosa utilizando-se óvulos doados aconteceu em 1984. Em 1992, o Conselho Federal de Medicina (CFM) elaborou a primeira resolução sobre reprodução assistida, na qual previa a utilização de óvulos doados altruisticamente (de forma altruísta). O que equivale a dizer, sem envolver nenhuma transação comercial, para que uma mulher incapaz de produzir óvulos férteis, pudesse ter sua prole utilizando a doação de óvulos. Partindo desse princípio, o Cenafert deu início no Brasil a um modelo de doação de óvulos no qual uma mulher jovem, estando em processo de fertilização in vitro (FIV), e tendo muitos óvulos colhidos, dividia com outra mulher esses óvulos excedentes (os quais não lhes fariam falta). Foi denominado por nós de DOAÇÃO COMPARTILHADA DE ÓVULOS. Assim sendo, nascia em Brasília, em 1994, o primeiro bebê de proveta obtido pela doação compartilhada de óvulos, na qual uma mulher jovem compartilhou os gametas obtidos com uma mulher em faixa etária acima de 40 anos. Ambas engravidaram e nasceram bebês saudáveis.
Quem necessita de óvulos doados
Nos dias de hoje, a mulher adia cada vez mais seu projeto maternal, em detrimento do seu momento mais apropriado para gestar, 20 a 30 anos de idade. A partir dos 35 anos inicia uma diminuição progressiva da população de folículos nos ovários. O óvulo situa-se no interior de cada folículo ovariano. A redução numérica se acompanha também da redução de qualidade dos óvulos residuais. Com isso, verificamos muitas situações onde a mulher necessita de óvulos doados para estabelecer sua prole. Esta é denominada, receptora. A principal causa é o declínio da reserva ovariana, notório após os 40 anos, que se reflete em resultados malsucedidos em ciclos de FIV com óvulos próprios. Outras razões aliam-se à ocorrência menopausa precoce (quando mulher deixa de menstruar antes dos 40 anos), causas genéticas, onde existe o risco de transmitir doenças causadoras de crianças malformadas. Também está indicada na ocorrência de repetidos ciclos de fertilização in vitro nos quais se obteve óvulos ou embriões de má qualidade e, eventualmente, abortamentos repetidos e de causa mal esclarecida. Entretanto, é importante salientar que a gravidez após os 40 anos, se acompanha de maiores riscos materno-fetais como diabetes, hipertensão e outros. Por essa razão, o CFM estabeleceu o limite de idade de 50 anos na mulher para prática de reprodução assistida. Após essa idade, a receptora, em casos especiais, tendo boa saúde geral e reprodutiva, e informada dos riscos da gestação tardia, poderá de beneficiar da gravidez com doação de óvulos.
Quem pode doar óvulos?
No processo de doação de óvulos temos de um lado a receptora, do outro a doadora que atende a um principio básico: o altruísmo em permitir que um óvulo seu venha gerar um filho em outra mulher, e conduzindo sua carga genética. Precisa ter outros requisitos: Ser jovem (o limite para uma mulher doar óvulos, segundo normas do CFM, é ter menos de 35 anos), ter uma excelente reserva ovariana para que possa produzir um número adequado de óvulos viáveis. O rastreio de enfermidades infecciosas e genéticas deve permitir segurança para que a receptora possa gerar fetos saudáveis. Por fim, a doadora deverá ter semelhança física e compatibilidade sanguínea com o casal receptor. Entre os modelos de doação de óvulos permitidos no Brasil existem princípios básicos. Como foi mencionado anteriormente, não é eticamente permitida a doação de óvulos com finalidade comercial. Doadoras e receptoras devem ser anônimas. Por exemplo, uma receptora não pode usar óvulos de uma pessoa de sua família. A doação compartilhada de óvulos, utilizada no Brasil desde a década de 90, se baseia no princípio de que uma mulher em idade jovem, com menos que 35 anos, e que produziu um mínimo de 12 óvulos maduros, pode doar metade dos óvulos para uma receptora e preservar sua capacidade reprodutiva com os óvulos que reteve para seu uso pessoal. A grande vantagem desse processo é que com apenas uma estimulação ovariana pode- se beneficiar duas famílias do ponto de vista reprodutivo. Doadora e receptora compartilham os óvulos, entretanto, compartilham também os custos do tratamento, em processo reconhecido pelo CFM. Um outro modelo é a simples doação altruística em que uma mulher pode doar óvulos visando beneficiar mulheres que necessitam de óvulos para gestar. Esses óvulos deverão ser utilizados em uma receptora anônima. Mulheres jovens (idade menor que 35 anos), com boa reserva ovariana que desejam criopreservar óvulos para utilização futura, podem realizar uma coleta ovular para sua própria utilização e uma outra coleta ovular para uma doadora. Nesse caso, o compartilhamento de custos será feito com a futura receptora. Existem, disponíveis e autorizados pela ANVISA, bancos de óvulos nacionais e de outros países que utilizam a doação altruística e podem ceder óvulos para que possa beneficiar receptoras em nosso País. Nesse caso, a Clínica assume o custo necessário para cobertura do processo que inclui estimulação ovariana com medicações, coleta ovular, insumos e trabalho laboratorial.
Como se dá o processo?
A estimulação ovariana é essencial para que o processo resulte em coleta ovular adequada e permita obter-se um mínimo de 12 óvulos maduros. O compartilhamento se dá de modo equitativo, permitindo boas chances de sucesso para ambas mulheres. Em caráter espontâneo, a hipófise, um órgão intracraniano, libera na espécie humana quantidades de FSH (hormônio folículo estimulante) capaz de estimular um dos ovários de modo limitado. Ou seja, amadurecer apenas um óvulo. Isso explica porque em outras espécies de animais nascem inúmeros filhotes e na espécie humana é rara a gestação espontânea gemelar. Visando obter vários folículos desenvolvidos e colher vários óvulos, utiliza-se uma dose adicional de FSH, a mesma substância que a hipófise produz espontaneamente para que obtenha uma estimulação ampliada dos ovários. O crescimento dos folículos é acompanhado por ultrassonografia e quando os mesmos atingem o tamanho adequado programa-se a coleta ovular. Os óvulos obtidos são avaliados pelo laboratório de reprodução assistida e aqueles maduros podem ser utilizados por doadora e receptora.
Conclusão
A FIV com óvulos doados representa uma técnica de reprodução assistida que se ajusta ao comportamento sociológico da mulher nos dias de hoje, onde adiar a maternidade tornou-se um fenômeno observado em todos os países. Muitas vezes, ao decidir gestar em fases mais tardias, o declínio da reserva ovariana obriga que se recorra à doação de óvulos para gestar com sucesso. Por outro lado, como disse Golden e col. (Golden Globes?), há alguns anos atrás, a possibilidade de uma mulher poder engravidar com óvulos doados veio estabelecer “uma igualdade de gênero para corrigir uma iniquidade biológica”. Isso porque o homem mantém sua capacidade fértil após os 50 anos e a possibilidade da mulher gestar espontaneamente cessa com evento da menopausa por volta dos 50 anos.